quarta-feira, 7 de agosto de 2019

Agrotóxicos na alimentação humana

Agrotóxicos e segurança alimentar



O Brasil é um dos principais produtores agrícolas do mundo e simultaneamente, o maior consumidor de agrotóxicos do mundo, sendo assim, ao discutir sobre segurança alimentar, se faz necessário tratar também da questão dos agrotóxicos com grande atenção.

Mas afinal, o que são agrotóxicos? Por definição da lei federal nº 7.802, de 11 de julho de 1989, regulamentada pelo decreto nº 98.816, caracteriza os praguicidas agrícolas com o nome de ‘Agrotóxicos’, definindo-os como: “Produtos e componentes de processos físicos, químicos ou biológicos destinados ao uso nos setores de produção, armazenamento e beneficiamento de produtos agrícolas, nas pastagens, proteção de florestas nativas ou implantadas, e de outros ecossistemas, e em ambientes urbanos, hídricos e industriais, cuja finalidade seja alterar a composição da flora e da fauna a fim de preservá-la da ação danosa de seres vivos considerados nocivos, bem como substâncias empregadas como desfolhantes, dessecantes, inibidores e estimuladores de crescimento”.

Dessa forma, os agrotóxicos são empregados sob a justificativa de que sem a utilização destes recursos, tona-se inviável a produção de alimentos em larga escala e, portanto, seria impossível atender a demanda por alimentos da população mundial.

Em contrapartida, o emprego de tais produtos gera impactos que podem ser irreversíveis do ponto de vista ambiental, uma vez que, ao atacar/exterminar formas de vida, seja de fauna ou flora, gera-se uma série de desequilíbrios ecológicos, por exemplo, o uso de inseticidas que se mostram nocivos às abelhas e/ou a demais insetos que atuam como agentes polinizadores, que por sua vez, são imprescindíveis para o sucesso reprodutivo de boa parte das plantas e portanto, fundamental para a plena produção dos alimentos de origem agrícola.

Além disso, a toxicidade no corpo humano a longo prazo ainda é em grande parte desconhecida, pois não existem estudos suficientes para determinar com maiores precisões os efeitos da ingestão dos alimentos que contenham agrotóxicos, mesmo que toleráveis e tidas como seguras pelos padrões de Ingestão Diária Aceitável (IDA) como descrito pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA).

No entanto, os trabalhores rurais que acabam por serem expostos à altas concentrações e com grande frequência aos agrotóxicos, podem apresentar quadros de intoxicação subcrônica (exposição por até 90 dias ), demonstrando sintomas como, dores abdominais, sonolência e fraqueza; ou intoxicação crônica; neste caso, os sintomas manifestam-se tardiamente a partir da exposição a longo prazo como meses e/ou anos, podendo levar a quadros mais graves como, câncer, problemas imunológicos, hormonais, neuronais, pulmonares, hepáticos, renais, além de possibilidades de aborto e malformação congênita no caso de gestantes.

Os agrotóxicos podem ser subdivididos em níveis de toxicidade que são expressos como “Dose Letal para 50% da população estudada” (DL50) em estudos pela via oral ou dérmica. Já para estudos pelas vias aéreas, utiliza-se a “Concentração Letal para 50% da população estudada” (CL50). Dessa forma são divididos em classes, sendo elas: I (extremamente tóxico); II (altamente tóxico); III (moderadamente tóxico) e IV (pouco tóxicos).

A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) é responsável pelo Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos (PARA), que é um dos poucos instrumentos empregados para a proteção do consumidor, por meio do qual são quantificadas as concentrações de tais substâncias presentes nos alimentos provenientes da agricultura e a partir das irregularidades encontradas, são emitidos relatórios a fim de promover melhorias nas políticas públicas de incentivo às boas práticas agrícolas, além de poder subsidiar incentivos de natureza fiscalizatória, regulatória e educativa. No entanto, esse programa só analisa produtos de origem vegetal, o que não inclui produtos de origem animal (carnes, leites e derivados) e água.










Desde 01 de janeiro até o dia 22 de julho de 2019, foram aprovados 262 agrotóxicos pelo Ministério da Agricultura e divulgados no Diário Oficial da União (DOU), sendo em sua maioria produtos técnicos equivalentes aos demais que já foram aprovados anteriormente, com exceção de alguns que são inéditos, como o inseticida Clotianidina; o fungicida Piraclostrobina; o inseticida Surfoxaflor e o herbicida Florpirauxifen-benzil, sendo que os três primeiros apresentaram a partir de pesquisas, nocividade às populações de abelhas.

Como citado anteriormente, a ANVISA não monitora as quantidades de agrotóxicos em água e produtos de origem animal, como carne, leite e derivados. No caso da água, o órgão responsável pela análise é o Sistema de Informação de Vigilância da Qualidade da Água para o Consumo Humano (Sisagua), ligado ao Ministério da Saúde.

A partir dos dados obtidos entre 2014 e 2017, houve um esforço em conjunto realizado pela Repórter Brasil, Agência Pública e a Public Eye (Suíça), gerando assim um mapa de contaminação de abastecimento de água no Brasil, de modo que 1 em 4 cidades do país indicaram uma mistura de agrotóxicos, de modo que 1.396 municípios detectaram os 27 agrotóxicos cujas análises são previstas por lei, sendo 16 destas caracterizados como extremamente tóxicas e 11 como associadas ao desenvolvimento de doenças crônicas como câncer, problemas hormonais e malformações congênitas.





Portanto, a partir de todos os dados expostos, como proceder para tentar obter maior segurança alimentar? Algumas medidas podem ser tomadas, como por exemplo: obter alimentos de origem orgânica, produzidos em sistemas agroflorestais que não se utilizam de agrotóxicos; lavar bem os alimentos vegetais oriundos da agricultura convencional em água corrente e descascando tudo o que for possível, uma vez que boa parte desses compostos encontra-se depositada sobre as cascas e superfícies de folhas; e por fim, pressionar o Estado a fim de enrijecer os mecanismos de fiscalização bem como a legislação que se mostra amplamente permissiva em comparação à países da União Europeia.










Referências

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Acesso em: 04 ago. 2019.

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ANA ARANHA & LUANA ROCHA (São Paulo) (Ed.). "Coquetel" com 27 agrotóxicos foi achado na água de 1 em cada 4 municípios. 2019. Disponível em: <https://reporterbrasil.org.br/2019/04/coquetel-com-27-agrotoxicos-foi-achado-na-agua-de-1-em-cada-4-municipios/>. Acesso em: 05 ago. 2019.

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ANDRÉ CABETTE FÁBIO (São Paulo). Nexo Jornal. O aumento do número de agrotóxicos aprovados no Brasil: O ano de 2018 marcou o recorde de 450 produtos aprovados, contra 139 em 2015. 2019. Disponível em: <https://www.nexojornal.com.br/expresso/2019/02/05/O-aumento-do-n%C3%BAmero-de-agrot%C3%B3xicos-aprovados-no-Brasil>. Acesso em: 04 ago. 2019.



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