segunda-feira, 26 de abril de 2021

Microbiota intestinal no combate aos vírus , incluindo a covid-19.

Em busca de alternativas para combater infecções virais, incluindo a covid-19, microbiólogos estão recorrendo às bactérias já existentes no intestino humano.
Na imagem, a diversidade do microbioma intestinal pode ser vista nesta amostra de fezes humanas, incluindo uma enorme bactéria cerca de 50 vezes maior do que a E. coli. A composição dos micróbios de cada pessoa é única. Cientistas estão descobrindo diversas maneiras pelas quais esses micróbios afetam nossa saúde, peso, humor e até mesmo nossa personalidade. 

 O estilo parasitário dos vírus os torna um inimigo desafiador. Os tratamentos tradicionais, como medicamentos antivirais e vacinas, são difíceis de desenvolver, podem produzir efeitos colaterais indesejáveis e ainda podem perder eficácia se os vírus sofrerem mutação. Alguns cientistas agora buscam inovações e destacam que não estamos sozinhos nessa luta. Dentro de nosso organismo ou sobre sua superfície, vivem trilhões de micróbios — conhecidos coletivamente como microbioma humano — que dependem do corpo humano para sua sobrevivência. Os pesquisadores estão atualmente analisando se podem utilizar esses micróbios para reforçar o sistema imune e colaborar com o combate aos invasores virais.

 Nas últimas décadas, os cientistas aprenderam muito sobre a microbiota intestinal, sobretudo sua flora bacteriana. Já existe um consenso científico de que as bactérias intestinais auxiliam na digestão e produzem alguns nutrientes. Tudo indica que também se comuniquem com outras partes do corpo, como o cérebro, por meio de sinais químicos. Por exemplo, as bactérias intestinais produzem neurotransmissores como a serotonina, que podem regular o humor ou os estados mentais. Elas também podem afetar o sistema imune, o que chamou a atenção dos pesquisadores de doenças infecciosas.

 “Imagine micróbios capazes de impedir a invasão de um vírus a uma célula ou micróbios que se comunicam com células, tornando-as menos desejáveis para o vírus se fixar”, afirma Mark Kaplan, chefe do departamento de microbiologia e imunologia da Faculdade de Medicina da Universidade de Indiana. “Manipular esses canais de comunicação pode nos oferecer um arsenal para ajudar o corpo humano a combater os vírus de forma mais eficiente.” 

O tormento da covid-19, causada pelo vírus Sars-CoV-2, aumentou o interesse por uma possível associação entre os microbiomas das pessoas e sua capacidade de combater viroses. A covid-19 produz poucos ou nenhum sintoma em muitas pessoas, mas pode ser fatal para outras. O motivo dessas reações completamente discrepantes à infecção por Sars-CoV-2 permanece um mistério, mas novos estudos sugerem que o estado do microbioma do paciente pode ser um fator contribuinte.

 A covid-19 geralmente é mais grave em idosos, bem como em pessoas de qualquer idade com doenças preexistentes, como obesidade, diabetes e câncer. Essas doenças preexistentes também já foram associadas a diferenças no microbioma das pessoas. E uma série de estudos preliminares documentou microbiomas incomuns em pacientes internados com covid-19. Se houver uma forte associação entre os micróbios intestinais e a gravidade da covid-19, há a possiblidade de alterar o microbioma para combater o Sars-CoV-2 e outros vírus. 

“Se for considerado que as bactérias intestinais são os guardiões entre os alimentos e nosso corpo”, pondera Kaplan, “é possível notar que alguns guardiões podem ser mais eficazes do que outros no combate aos intrusos”. 


Na imagem da Escherichia coli em microscópio eletrônico de varredura, são observados bastonetes amarelos agrupados em substrato roxo.


Como o microbioma intestinal ajuda 

 Centenas de espécies diferentes de bactérias colonizam o intestino. Essa comunidade contém cerca de 40 trilhões de células, o que corresponde a pouco mais do que a quantidade de células do corpo humano. Essa flora enorme pode contribuir para a eliminação dos vírus por meio de três mecanismos principais: formação de uma barreira aos invasores, implantação de um ataque avançado e suporte ao sistema imune. 

Para entender a primeira linha de defesa, lembre-se de que seu intestino é como um tubo. Nesse tubo, o alimento é degradado para que os nutrientes possam ser absorvidos. Ao mesmo tempo, são gerados metabólitos contendo compostos bioquímicos prejudiciais e também estão presentes patógenos consumidos inadvertidamente. Para direcionar os metabólitos e micróbios patogênicos diretamente à rota de saída, as células da parede interna do intestino produzem uma camada protetora constituída de muco. As bactérias intestinais parecem influenciar a produção dessa importante barreira de muco, o que poderia impedir que os vírus no intestino atingissem outras partes do corpo. 

Mas danos a essa camada de muco podem tornar o intestino permeável, o que permite que os metabólitos e patógenos possivelmente perigosos escapem a outros sistemas orgânicos, onde podem causar infecções ou inflamações nocivas.

 Um intestino permeável também pode promover doenças autoimunes. Por isso, alguns cientistas sugeriram que distúrbios na microbiota intestinal podem estar ligados à chamada “tempestade de citocinas”, uma resposta imune descontrolada que se acredita ser um possível fator causador de casos graves de covid-19. 

Além dos pulmões e do intestino, o vírus Sars-CoV-2 foi detectado no fígado, rim, coração e cérebro. Além disso, há cada vez mais evidências de que micróbios no intestino podem afetar a saúde dos pulmões por meio de comunicações químicas. Em macacos, por exemplo, os pesquisadores constataram que o Sars-CoV-2 provoca alterações no microbioma intestinal até o décimo dia de infecção; algumas das alterações persistem por mais de 26 dias. Vale destacar que macacos infectados apresentaram uma redução na quantidade de espécies de bactérias conhecidas por produzirem ácidos graxos de cadeia curta (AGCCs), moléculas importantes que podem regular o sistema imune. Estudos em ratos revelaram que AGCCs produzidos por micróbios intestinais circulam na corrente sanguínea e chegam a outras áreas do corpo, como pulmões, protegendo os animais de vírus respiratórios.

 O microbioma também pode combater vírus ao produzir compostos químicos que interferem no ciclo de vida viral. Por exemplo, algumas bactérias produzem toxinas denominadas bacteriocinas para combater outras cepas concorrentes de bactérias. Mas estudos em culturas de células em laboratório sugerem que essas bacteriocinas também podem inibir as atividades de alguns vírus. As bactérias Streptomycetes produzem uma bacteriocina, denominada duramicina, que bloqueia a entrada do vírus-do-nilo-ocidental, da dengue e do ebola em suas células hospedeiras. Outras bacteriocinas interrompem a replicação dos vírus da herpes simples. 

Um terceiro mecanismo pelo qual o microbioma pode colaborar com o combate aos vírus é por seu reforço ao sistema imune. Um estudo demonstrou que indivíduos que consumiram Lactobacillus, bactéria comumente encontrada em alimentos fermentados e iogurtes, em conjunto com uma dose de reforço da vacina contra a poliomielite, produziram anticorpos neutralizantes do vírus da poliomielite em uma taxa mais elevada. 

Outro estudo, liderado por Dennis Kasper, imunologista do Instituto Blavatnik da Faculdade de Medicina de Harvard, comprovou que bactérias intestinais conhecidas como bacteroidetes estimulam a liberação de interferons por células imunes intestinais. Os interferons são fatores importantes que aumentam a reação do organismo aos vírus e ajudam a eliminar as células infectadas. Quando o microbioma se desequilibra ou se torna disbiótico, nossas defesas imunológicas podem ficar comprometidas. As “bacteroidetes constituem entre 40% e 50% das mais de 200 espécies de micróbios existentes no intestino da maioria das pessoas”, explica Kasper. Pessoas disbióticas e sem esse equilíbrio normal de micróbios ficam mais suscetíveis a diversas doenças.

 Interferindo no microbioma

 Diante das evidências crescentes do papel do microbioma no fortalecimento do sistema imune para o combate aos vírus, os pesquisadores estão buscando formas de aplicar essas descobertas em terapias e diagnósticos. 

Como algumas espécies de bactérias intestinais foram associadas a piores desfechos em infecções virais, alguns pesquisadores propuseram utilizar essas bactérias como “biomarcadores” ou indicadores de diagnóstico. Por exemplo, Ana Maldonado-Contreras, microbióloga da Faculdade de Medicina da Universidade de Massachusetts, relatou recentemente em uma pesquisa preliminar que a bactéria intestinal Enterococcus faecalis, também relacionada à inflamação crônica, é um indicador confiável de casos graves de covid-19. Maldonado-Contreras afirma que exames para detectar a presença dessa espécie de bactéria “podem ser um meio eficiente para identificar pacientes com maior probabilidade de desenvolver uma forma grave de infecção que requer maior atenção e intervenção clínica”. 

Em termos de tratamento, os pesquisadores obtiveram êxito notável no transplante de microbiomas saudáveis em pacientes sem um microbioma saudável. O procedimento, denominado transplante de microbiota fecal, foi aprovado apenas para o tratamento de casos de colite bacteriana causada por infecção por Clostridium difficile (CDI, na sigla em inglês). O transplante de microbiota fecal cura com sucesso mais de 90% dos pacientes com CDI, o que sugere que outras doenças também podem ser tratadas com essa técnica. “Se a saúde intestinal afetar o prognóstico de covid-19, é preciso se valer disso para um melhor tratamento e prevenção da doença”, argumenta Kim. “Acredito que o transplante de microbiota fecal possa ser estudado como tratamento, ao menos para pacientes com um prognóstico ruim.” 

Outra forma inovadora de alterar o microbioma pode ser por meio de bacteriófagos, que são vírus que infectam e matam determinadas espécies de bactérias. Em tese, os bacteriófagos poderiam ser administrados a pacientes para eliminar espécies bacterianas do microbioma que suprimem a capacidade do sistema imune de combater viroses. Em outras palavras, um vírus que destrói algumas bactérias seria utilizado para combater outro vírus que infecta células humanas por meio da alteração das bactérias colonizadoras do intestino humano.

 Em vez de remodelar o microbioma, alguns pesquisadores preferem uma abordagem mais refinada. Se as moléculas benéficas produzidas por uma determinada espécie de bactéria intestinal puderem ser identificadas, poderiam ser fabricadas e administradas na forma de pílulas. 

Por exemplo, as bactérias bacteroidetes, mencionadas acima, possuem uma molécula específica na superfície de suas células denominada glicolipídio, o qual estimula a liberação de interferons antivirais por parte das células intestinais do sistema imune. “Uma possibilidade promissora de nossa descoberta é que o glicolipídio indutor do interferon do tipo I poderia ser sintetizado e talvez até utilizado como profilaxia em indivíduos de risco”, afirma Kasper. Sua equipe testou essa hipótese e concluiu que ratos poderiam ser protegidos de infecções virais ao ser acrescentado esse glicolipídio bacteriano em sua água. 

A forma de interação entre o microbioma e os vírus é complexa. A maioria dos estudos vem se concentrando na flora bacteriana do microbioma humano, relegando amplamente as contribuições de fungos, protozoários, bacteriófagos e outros vírus intestinais a um segundo plano. Mas novas pesquisas apontam para novas estratégias terapêuticas que poderiam ser exploradas na batalha contra as doenças infecciosas.

 Cultivando um microbioma saudável 

 Como o conhecimento do microbioma intestinal ainda está em seus primórdios, alguns argumentam que é prematuro chegar a conclusões categóricas sobre seu papel no combate a infecções virais como a da covid-19. 

Jonathan Eisen, microbiólogo diretor do programa especial de pesquisas em microbioma da Universidade da Califórnia em Davis, adverte que são necessárias mais pesquisas. “Estou preocupado com as alegações de uma possível relação causal entre o microbioma e o risco de infecção e de casos graves de covid-19 sem comprovação dessa relação causal.” Até o momento, foram observadas apenas correlações entre a infecção por covid-19, marcadores de inflamação e o microbioma, segundo Eisen. O desafio é determinar qual é o fator causador dessas correlações — elas podem, por exemplo, ser causadas por mudanças dietéticas ocorridas quando alguém adoece ou ainda podem ser devidas à resposta imune à infecção. “Contudo, neste momento, não é possível concluir que o microbioma desempenhe algum papel direto sobre questões relacionadas à covid-19.”

 Também é difícil fornecer instruções exatas sobre como aumentar o microbioma para uma maior resistência a viroses. O microbioma de cada pessoa é diferente, afetado por uma combinação complexa de fatores genéticos, dietéticos e ambientais. Há um consenso geral, entretanto, de que uma dieta rica em prebióticos e probióticos, junto com exercícios físicos regulares, ajude a promover um microbioma saudável e proteja contra a permeabilidade intestinal. 

Os prebióticos são um tipo de fibra encontrado apenas em vegetais e alguns suplementos. Alguns exemplos de alimentos ricos em fibras são alcachofras, aspargos, cebolas, feijões e frutas vermelhas. Os prebióticos foram bastante estudados e foi demonstrado que melhoram a integridade intestinal. Alimentos probióticos contêm bactérias ou leveduras vivas benéficas à saúde digestiva e incluem alimentos fermentados como kefir, chucrute, kimchi e iogurte. 

Quanto aos exercícios físicos, estudos em ratos demonstraram que exercícios reduzem a inflamação e promovem a integridade intestinal. É de amplo conhecimento que exercícios melhoram os níveis de AGCC ao equilibrar a microbiota, o que contribui para a nutrição e cicatrização das células que revestem o intestino. 

Kim espera que esses novos estudos ajudem a motivar as pessoas a cuidarem adequadamente de sua microbiota para se proteger contra infecções e doenças inflamatórias crônicas. “O aumento do consumo de fibras é uma forma eficaz de melhorar o microbioma intestinal e pode contribuir para um melhor tratamento e prevenção de covid-19 no momento atual e também de doenças crônicas ao longo da vida.” 

 Fonte:

 National Geografic. Microbiota intestinal pode ser o mais novo recurso no combate aos vírus. PUBLICADO 23 DE ABR. DE 2021 12:15 BRT

quarta-feira, 21 de abril de 2021

Detecção de pesticidas em alimentos desenvolvido pela UFC

Com o aumento populacional mundial, há também o aumento da demanda de alimentos e matérias-primas; mediante isso há um estímulo na elaboração de tecnologias ativas na parte do agronegócio. Contudo essa tecnologia ainda não é o suficiente para a eliminação de pragas, sendo necessário o uso de pesticidas, aumentando assim cada vez mais o uso de agroquímicos.

Fonte: Google Imagens

A vigente lista ampliada de agrotóxicos permitidos no Brasil e sua utilização na maioria das vezes de forma desordenada, se mostrou de grande importância para os pesquisadores do Programa de Pós-Graduação em Química da UFC. Entusiasmados mediante a essa polêmica e, em parceria com duas universidades chilenas, decidiram criar um método rápido e barato para a detecção de pesticidas em alimentos, por meio da utilização de sinais ópticos.

O conceito parte de uma simples premissa: misturar o alimento a ser analisado em uma solução que contém sonda fluorescente. Após isso, se a solução apresentar emissão de luz em uma certa intensidade, significa que o alimento em questão encontra-se contaminado com agrotóxicos. Além de, ser capaz de reconhecer qual o pesticida se apresenta na amostra, através da análise da luz emitida, ou seja, de acordo com a intensidade apresentada atribui-se a um elemento diferente.

Fonte: Portal da Universidade Federal do Ceará

A pesquisa proporcionou o Prêmio Ícaro de Souza Moreira, do Programa de Pós-Graduação em Química da UFC, tendo publicado o artigo sobre o trabalho, sendo o mesmo coordenado pelo Grupo de Química de Materiais Avançados (GQMAT-UFC).

O trabalho é realizado por pontos quânticos de carbono (CQDs) para identificar as proteínas. Sendo os mesmos nanopartículas, ou seja, partículas cuja ordem de grandeza é nove vezes menor que o metro, que demonstram ótimas propriedades de biocompatibilidade e domínio de emissão de luz.

Na pesquisa utilizou-se para testes, alimentos determinados por meio de relatórios da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), sendo, arroz, cenoura, pimentão e laranja, considerados os que apresentam maior possibilidade de possuir os pesticidas estudados, visto que eles têm o uso permitido até determinada concentração.

De acordo com o Prof Rafael Melo Freire, parceiro na pesquisa pela Universidad Autónoma de Chile e pesquisador do Centro para el Desarrollo de la Nanociencia y Nanotecnología (CEDENNA), “ o método proposto compreende de um conjunto de sinais ópticos que possibilita fazer a detecção de todo e qualquer pesticida naquele alimento. Podendo interpretar esses sinais como uma impressão digital única para cada um dos pesticidas utilizados, fazendo após a análise o registro no banco de dados para cada pesticida.”

O método desenvolvido pela UFC possui o diferencial de ser bem mais fácil e barato que outras soluções já existentes no mercado e, diferente das soluções já utilizadas, essa não necessita da presença de um analista para elucidar os resultados. Na forma como o trabalho se encontra atualmente, presume-se que há dois públicos-alvos para o produto, as agências reguladoras, que são capazes de utilizar o mesmo para a inspeção da quantidade de pesticidas nos alimentos comercializados e os grandes compradores, que obtém grandes quantidades de alimentos para revender em postos de abastecimento. Isso ocorre pois até o momento para a realização da técnica é necessário o uso de equipamentos laboratoriais.

A pesquisa ainda está em andamento tendo como objetivo elaborar um produto que não precise de equipamentos laboratoriais. Segundo o Prof. Pierre Fechine “ O intuito é criar um dispositivo de fácil uso, que mesmo os pequenos produtores rurais ou até mesmo os consumidores finais possam operar e identificar pesticidas nos alimentos.” E esse próximo passo da pesquisa consiste na fabricação de um tipo de sensor que possibilitará a identificação de pesticidas em amostras de alimentos, de forma fácil, revolucionária e barata.

Fonte: Agência UFC

O sensor já está em fase de elaboração por meio de kits de identificação, que apresentariam todos os materiais necessários para a detecção e um equipamento para a identificação óptica para analisar a alteração de intensidade da luz apresentada. Avaliam também a viabilidade de observar além da presença de praguicidas a sua quantidade nos alimentos. 


REFERÊNCIAS

EMBRAPA - Pesticidas e seus impactos no ambiente

Universidade Federal do Ceará - Agência UFC: Pesquisadores criam tecnologia mais rápida e barata de identificação de pesticidas em alimentos

Agência UFC - UFC cria tecnologia mais rápida e barata de identificação de pesticidas em alimentos

ScienceDirect - Estratégia de detecção baseada em pontos quânticos de carbono obtidos da riboflavina para a identificação de pesticidas


sábado, 10 de abril de 2021

O USO DE SULFITOS NA CONSERVAÇÃO DO CAMARÃO: QUAIS OS RISCOS?

O camarão é um crustáceo que habita água doce e salgada, sendo de bom valor comercial. O Nordeste do Brasil tem se destacado como um dos maiores produtores brasileiros do camarão branco do Pacífico (Litopenaeus vannamei), cultivado principalmente em viveiros.

A despesca do camarão marinho Litopenaeus vannamei acontece quando o crustáceo atinge o tamanho e peso desejados pelo produtor. A morte é ocasionada por choque térmico, em água gelada e em seguida, é adicionado um aditivo alimentar antioxidante, o metabissulfito de sódio (Na2S2O5).

Nas fazendas de camarão, o procedimento usual é a imersão dos camarões despescados, em água com gelo contendo metabissulfito de sódio, que é muito utilizado na indústria alimentícia como inibidores da reação oxienzimática de escurecimento, em especial, para reduzir a melanose dos camarões, processo que afeta a sua coloração de escurecimento devido à formação de melanina. Essa mudança de cor afeta muito a venda do camarão, a ponto de ser rejeitada pelos consumidores, embora por si só não tenha efeitos prejudiciais à saúde, mas lhe dá um aspecto desagradável que diminui sua qualidade, prazo de validade e anula seu valor comercial.

Imagem: (1) Camarão com melanose e (2) camarão no gelo com metabissulfito.

Fonte: Google Imagens

Para a inibição do aparecimento dessas manchas pretas, o uso de sulfitos constitui um dos métodos mais simples, de custo mais barato e o mais eficiente, tendo como agente ativo o dióxido de enxofre (SO2). Este aditivo atua inibindo a enzima polifenoloxidase e, portanto previne ou retarda a melanose preservando a qualidade do camarão. A forma de utilização é imergir o camarão, imediatamente após a colheita, em uma solução que pode ser de 10% a 12% por quinze a vinte minutos com água e gelo. A temperatura da solução não deve ser superior a 2°C. É importante fazer este tratamento antes do início da melanose. Desta forma, o camarão absorve o metabissulfito de sódio. Posteriormente, é transportado para a planta de beneficiamento para ser classificado e embalado in natura, refrigerado ou congelado. Durante esse processo, o dióxido de enxofre SO2 é gradualmente eliminado por drenagem e evaporação, diminuindo sua concentração inicial.

Níveis de teor de sulfitos seguros e recomendados

A Resolução CNS/MS Nº 04, de 24 de novembro de 1988, estabelece os limites máximos do uso de aditivos e de coadjuvantes de tecnologia do camarão congelado, sendo para o metabissulfito de 0,01g para camarões e lagostas frescos logo após a despesca e 0,03g para camarões e lagostas cozidas. Na mesma portaria, destaca que deve conter no rótulo que ocorreu o uso do metabissulfito de sódio (BRASIL, 1988).

E ainda, segundo a OMS, os resíduos do metabissulfito de sódio é o dióxido de enxofre (SO2), não devem ultrapassar as concentrações da faixa de 40 ppm a 100 ppm, tanto para camarão fresco quanto congelado.


Então, quais os riscos do uso de metabissulfito no camarão?

O metabissulfito de sódio em contato com ácidos, água e/ou gelo libera o gás dióxido de enxofre (SO2) é corrosivo, e que pode ser mortal se inalado. Pode causar reações alérgicas severas em pessoas asmáticas ou sensíveis a sulfitos. Concentrações e tempo de imersão elevados causam níveis de dióxido de enxofre (SO2) residual no camarão maiores que 100 ppm, valor acima do permitido pela legislação brasileira, e que poderá ocasionar crises de asma, reações cutâneas (urticárias), diarréias, choque anafilático, dores de cabeça, dores abdominais, náuseas e tonturas. Essas reações podem ser graves em usuários sensíveis. Por esse motivo, os níveis de SO2 devem ser controlados antes de lançar o produto no mercado. É importante que exista um sistema ou norma que estabeleça um estudo e gestão de riscos para evitar que um produto com falta de segurança entre no mercado.

A concentração máxima permitida pela legislação nem sempre é respeitada, pois há relatos de produtores sem licença e indústrias clandestinas (sem serviço de inspeção) que não respeitam o limite estabelecido. Os camarões podem ser submetidos à metabissulfito tanto na despesca quanto na indústria. A legislação determina que o camarão possua uma concentração máxima deste composto, indiferente se é na recepção desse produto ou na expedição dele. Auditorias sanitárias executadas pelo órgão responsável tem como objetivo principal garantir um alimento seguro para consumo. Uma solução para a falta de padronização seria o uso de metabissulfito somente na despesca, permitindo um melhor controle sobre a quantidade do produto utilizada.

Dentre essas críticas ao uso do metabissulfito, destaca-se ainda o lançamento de resíduos do produto nos corpos hídricos, fato que provoca a morte da flora e da fauna aquática da região adjacente. Além disso, existem críticas também ao manejo do produto nas fazendas, onde os trabalhadores muitas vezes utilizam o metabissulfito sem treinamento e equipamentos adequados, visto que são produtos irritantes das vias respiratórias.

Mas como adquirir camarão seguro e dentro das normas?

Adquira somente produtos com o selo de serviço de inspeção, pois esses possuem auditoria do órgão fiscalizador e, consequentemente, uma maior garantia de qualidade. Além disso, dê preferência para empresas consolidadas no mercado, pois estas provavelmente inserem esse perigo no seu programa de APPCC (Análise de Perigos e Pontos Críticos de Controle), que também é um requisito para exportação.

O uso correto deste produto químico seguindo as normas de segurança para o manuseio, para o descarte do resíduo e para a concentração no alimento, não apresenta perigo para o homem ou para o meio ambiente. A questão está na responsabilidade e a ética de quem o está utilizando.

 

Fontes:

GAMA, L. G. Influência Do Teor Residual De Sulfito Sobre A Qualidade Do Camarão Marinho. Dissertação (Mestrado). Centro de Tecnologia de Alimentos. Universidade Federal da Paraíba – UFPE. João Pessoa, 2015.

O metabissulfito de sódio e o seu uso na carcinicultura. Disponível em < https://panoramadaaquicultura.com.br/o-metabissulfito-de-sodio-e-o-seu-uso-na-carcinicultura/> Acesso em: 05 Abr. 2021.

Sulfitos no camarão: qual é o risco? Disponível em: < https://foodsafetybrazil.org/sulfitos-no-camarao-qual-e-o-risco/> Acesso em: 05 Abr. 2021.

GÓES, L. et al. Uso do metabissulfito de sódio no controle de microorganismos em camarões marinhos Litopenaeus vannamei. Acta Scientiarum. Biological Sciences, v. 28, n. 2, 2006, pp. 153-157 Universidade Estadual de Maringá. Maringá, 2006.



sexta-feira, 9 de abril de 2021

A origem do SARS-Cov-2 é alimentar?



Muito tem se discutido acerca da origem do novo coronavírus, que é responsável pela maior pandemia e crise sanitária e humanitária do século XXI, até então. Desde meados do ano de 2019, com o episódio de transmissão inicial em massa na cidade de Wuhan, na China, tem se estudado sobre a origem do vírus. Atualmente, ainda não se tem certeza acerca da origem exata do vírus, mas sabe-se que é muito provável que o vírus, já encontrado décadas atrás em animais selvagens como algumas espécies de morcegos e pangolins, tenha passado dos animais silvestres para os humanos.


Morcego. Fonte: Unsplash


Pangolin. Fonte: Reuters







Tendo em vista a China, o país mais populoso do mundo atualmente, com cerca de 1,39 bilhão de pessoas, aliado ao convívio cada vez mais próximo entre animais silvestres e populações humanas, ambas competindo por espaço, bem como a falta de condições adequadas de saneamento básico, que somente a desigualdade social sabe proporcionar, tem-se então, um cenário favorável para que o fenômeno de spillover (salto do vírus de animais selvagens para humanos), finalmente ocorra.

Diversas podem ser as vias de infecção pelo vírus através do contato com os animais, seja pelo contato com urina e fezes de, seja pela mordida de um morcego infectado, ou até mesmo pelo consumo destes animais como forma de subsistência. Grupos de pesquisa foram enviados à cidade de Wuhan após o início do surto para investigar a possibilidade do vírus ter se difundido a partir de um mercado local de frutos do mar, que também comercializa animais silvestres vivos em condições muitas vezes precárias, como em diversos países no mundo.

No entanto, as autoridades competentes atuantes no país, alegaram que testaram todo o local em busca do vírus nos animais e nada foi encontrado. Dessa forma, outra hipótese tem sido estudada, a de que o vírus tenha circulado através de alimentos congelados (transmissão por cadeia de frio), o que torna a origem do vírus ainda mais incerta. E que o mercado na cidade de Wuhan, na realidade teria sido o ponto inicial de maior disseminação do vírus, dado o grande volume de circulação diária de pessoas na região, mas não o ponto de origem.

Mas uma coisa é certa, a pandemia de SARS-Cov-2 reforça ainda mais a importância das questões socioambientais e como a espécie humana, tem se relacionado com o meio ambiente de forma predatória e desrespeitosa, trazendo à tona a necessidade de repensar o modo de vida que levamos.

Por tanto, é importante ressaltar o quão imprescindível é ter atenção com o saneamento básico, o que se aplica também aos alimentos, seja atentarmo-nos com a procedência dos ingredientes, com a higienização adequada (com emprego de água sanitária diluída em água potável, na escala de uma colher de sopa para 1 L de água), tanto dos alimentos, quanto das mãos dos manipuladores e de todos os utensílios e locais empregados no momento de preparo, da cocção correta, tanto de carnes e vegetais, a fim de eliminar quaisquer patógenos em potencial.


Para mais informações:


https://www.embrapa.br/busca-de-publicacoes/-/publicacao/1124525/guia-basico-de-higiene-domestica-para-a-prevencao-da-covid-19-e-outras-doencas


https://jornal.usp.br/artigos/covid2-o-que-se-sabe-sobre-a-origem-da-doenca/


https://jornal.usp.br/ciencias/covid-19-como-o-virus-saltou-de-morcegos-para-humanos/


https://www.esalq.usp.br/banco-de-noticias/o-covid-19-pode-ser-transmitido-por-alimentos


https://super.abril.com.br/ciencia/oms-covid-19-nao-surgiu-em-laboratorio-origem-animal-e-mais-provavel/