Agrotóxicos e segurança
alimentar
O Brasil é um dos principais
produtores agrícolas do mundo e simultaneamente, o maior consumidor
de agrotóxicos do mundo, sendo assim, ao discutir sobre segurança
alimentar, se faz necessário tratar também da questão dos
agrotóxicos com grande atenção.
Mas afinal, o que são
agrotóxicos? Por definição da lei federal nº 7.802, de 11 de
julho de 1989, regulamentada pelo decreto nº 98.816, caracteriza os
praguicidas agrícolas com o nome de ‘Agrotóxicos’, definindo-os
como: “Produtos e componentes de processos físicos, químicos ou
biológicos destinados ao uso nos setores de produção,
armazenamento e beneficiamento de produtos agrícolas, nas pastagens,
proteção de florestas nativas ou implantadas, e de outros
ecossistemas, e em ambientes urbanos, hídricos e industriais, cuja
finalidade seja alterar a composição da flora e da fauna a fim de
preservá-la da ação danosa de seres vivos considerados nocivos,
bem como substâncias empregadas como desfolhantes, dessecantes,
inibidores e estimuladores de crescimento”.
Dessa forma, os agrotóxicos são
empregados sob a justificativa de que sem a utilização destes
recursos, tona-se inviável a produção de alimentos em larga escala
e, portanto, seria impossível atender a demanda por alimentos da
população mundial.
Em contrapartida, o emprego de
tais produtos gera impactos que podem ser irreversíveis do ponto de
vista ambiental, uma vez que, ao atacar/exterminar formas de vida,
seja de fauna ou flora, gera-se uma série de desequilíbrios
ecológicos, por exemplo, o uso de inseticidas que se mostram nocivos
às abelhas e/ou a demais insetos que atuam como agentes
polinizadores, que por sua vez, são imprescindíveis para o sucesso
reprodutivo de boa parte das plantas e portanto, fundamental para a
plena produção dos alimentos de origem agrícola.
Além disso, a toxicidade no
corpo humano a longo prazo ainda é em grande parte desconhecida,
pois não existem estudos suficientes para determinar com maiores
precisões os efeitos da ingestão dos alimentos que contenham
agrotóxicos, mesmo que toleráveis e tidas como seguras pelos
padrões de Ingestão Diária Aceitável (IDA) como descrito pela
Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA).
No entanto, os trabalhores
rurais que acabam por serem expostos à altas concentrações e com
grande frequência aos agrotóxicos, podem apresentar quadros de
intoxicação subcrônica (exposição por até 90 dias ),
demonstrando sintomas como, dores abdominais, sonolência e fraqueza;
ou intoxicação crônica; neste caso, os sintomas manifestam-se
tardiamente a partir da exposição a longo prazo como meses e/ou
anos, podendo levar a quadros mais graves como, câncer, problemas
imunológicos, hormonais, neuronais, pulmonares, hepáticos, renais,
além de possibilidades de aborto e malformação congênita no caso
de gestantes.
Os agrotóxicos podem ser
subdivididos em níveis de toxicidade que são expressos como “Dose
Letal para 50% da população estudada” (DL50)
em estudos pela via oral ou dérmica. Já para estudos pelas vias
aéreas, utiliza-se a “Concentração Letal para 50% da população
estudada” (CL50).
Dessa forma são divididos em classes, sendo elas: I (extremamente
tóxico); II (altamente tóxico); III (moderadamente tóxico) e IV
(pouco tóxicos).
A Agência Nacional de
Vigilância Sanitária (ANVISA) é responsável pelo Programa de
Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos (PARA), que é um
dos poucos instrumentos empregados para a proteção do consumidor,
por meio do qual são quantificadas as concentrações de tais
substâncias presentes nos alimentos provenientes da agricultura e a
partir das irregularidades encontradas, são emitidos relatórios a
fim de promover melhorias nas políticas públicas de incentivo às
boas práticas agrícolas, além de poder subsidiar incentivos de
natureza fiscalizatória, regulatória e educativa. No entanto, esse
programa só analisa produtos de origem vegetal, o que não inclui
produtos de origem animal (carnes, leites e derivados) e água.
Desde 01 de janeiro até o dia 22
de julho de 2019, foram aprovados 262 agrotóxicos pelo Ministério
da Agricultura e divulgados no Diário Oficial da União (DOU), sendo
em sua maioria produtos técnicos equivalentes aos demais que já
foram aprovados anteriormente, com exceção de alguns que são
inéditos, como o inseticida Clotianidina; o fungicida
Piraclostrobina; o inseticida Surfoxaflor e o herbicida
Florpirauxifen-benzil, sendo que os três primeiros apresentaram a
partir de pesquisas, nocividade às populações de abelhas.
Como citado anteriormente, a
ANVISA não monitora as quantidades de agrotóxicos em água e
produtos de origem animal, como carne, leite e derivados. No caso da
água, o órgão responsável pela análise é o Sistema de
Informação de Vigilância da Qualidade da Água para o Consumo
Humano (Sisagua), ligado ao Ministério da Saúde.
A partir dos dados obtidos entre
2014 e 2017, houve um esforço em conjunto realizado pela Repórter
Brasil, Agência Pública e a Public Eye (Suíça), gerando assim um
mapa de contaminação de abastecimento de água no Brasil, de modo
que 1 em 4 cidades do país indicaram uma mistura de agrotóxicos, de
modo que 1.396 municípios detectaram os 27 agrotóxicos cujas
análises são previstas por lei, sendo 16 destas caracterizados como
extremamente tóxicas e 11 como associadas ao desenvolvimento de
doenças
crônicas como câncer, problemas hormonais e malformações
congênitas.
Portanto, a partir de todos os
dados expostos, como proceder para tentar obter maior segurança
alimentar? Algumas medidas podem ser tomadas, como por exemplo: obter
alimentos de origem orgânica, produzidos em sistemas agroflorestais
que não se utilizam de agrotóxicos; lavar bem os alimentos vegetais
oriundos da agricultura convencional em água corrente e descascando
tudo o que for possível, uma vez que boa parte desses compostos
encontra-se depositada sobre as cascas e superfícies de folhas; e
por fim, pressionar o Estado a fim de enrijecer os mecanismos de
fiscalização bem como a legislação que se mostra amplamente
permissiva em comparação à países da União Europeia.
Referências
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Galerani; NISHIYAMA, Paula. Agrotóxicos - Aspectos gerais e
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<https://www.nexojornal.com.br/podcast/2019/05/21/O-ritmo-acelerado-de-libera%C3%A7%C3%A3o-de-agrot%C3%B3xicos-no-Brasil>.
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2019. Disponível em:
<https://www.nexojornal.com.br/expresso/2019/02/05/O-aumento-do-n%C3%BAmero-de-agrot%C3%B3xicos-aprovados-no-Brasil>.
Acesso em: 04 ago. 2019.
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